segunda-feira, 16 de junho de 2008

Discussão limitada!




Soube de um artigo do colunista da Folha de S. Paulo, Nelson Ascher sobre a obrigatoriedade das disciplinas Sociologia e Filosofia no Ensino Médio.

Foi na Folha Ilustrada, do dia 09 de Junho que Ascher publicou sua crítica sobre a inserção das disciplinas. Com o título "Doutrinação barata", Ascher inicia seu texto dizendo que discutiu com amigos a respeito da obra "Crime e Castigo", de Dostoiévski, e não conseguira lembrar o nome do personagem ao qual recordava características físicas, psicológicas e sócio-econômicas. Somente 2 dias depois "para que, de súbito, seu nome me viesse como que por milagre: Svidrigailov".

Santo Deus!

A partir disso, remete à considerável educação a que teve acesso: "um dos melhores colégios de São Paulo", e valoriza o papel da escola por promover o ingresso de metade de sua classe em escolas de medicina, etc.

Impressionante o valor dado por Ascher a sua escola: "(...) decerto prova que a escola sabia maximizar nossa capacidade de memorizar as informações necessárias para atingirmos as metas propostas".

Impressionante!

Mas, para Ascher, como diz, nada restou em seus neurônios "do grosso" que lá aprendeu em disciplinas como trigonometria e química orgânica. No caso de Dostoiévski, a leitura foi realizada num período extra-escolar.

"Cada qual de nós preserva em si aquilo que o atrai, emociona, interessa". E pareceu que Ascher retirou da escola o papel para tais possibilidades. "Respostas que antecedam as perguntas são piores que inúteis" significa a prática pedagógica dos professores.

Para Ascher, Sociologia e Filosofia é uma sobrecarga "num país que mal ensina (e ensina mal) coisas fundamentais como matemática, escrita e leitura".

E acrescenta não haver lugar para recrutar bons professores de Sociologia e Filosofia, nem verbas para contratação. E ainda, "não há nem haverá interesse algum por parte das vítimas potenciais, os alunos".

Problemas são nossos alunos!!! Nada na escola é interessante não é mesmo!?

Sem dúvida, há em Ascher alguma frustração a respeito do que, de fato, existe entre professores e, no caso, os que escolheram as formações em Sociologia ou Filosofia. Essa frustração está expressa: "Eles (as autoridades e interessados nas disciplinas no currículo) falam em encorajar a visão ou pensamento crítico. Essa expressão nojenta oculta, ou melhor, revela o ápice da arrogância: nossa maneira de pensar, que chamamos mentirosamente de 'crítica', é a certa, a única certa".

E termina afirmando ser as disciplinas Sociologia e Filosofia no Ensino Médio "doutrinação barata".

Num outro momento, lendo o artigo "Habilidades do Século XXI", do Pedro Demo, refleti a respeito de seu argumento sobre o uso do computador por uma criança: "saber ler, escrever e contar tornou-se habilidade secundária, mero pressuposto. Qualquer criança que tem acesso a computador em casa, aprende a mexer nele antes de ler e escrever. (...) Na prática, ler, escrever e contar continuam procedimentos importantes na vida das pessoas, porque são habilidades indispensáveis para a cidadania e a produtividade, em especial em sociedades mais atrasadas."

Daí, Demo discute que a preocupação atual está no "bom manejo da informação e comunicação" e não no simples e mecânico uso (nada de memorização!), expresso em números nos levantamentos estatísticos sobre acesso, como podemos ver nos relatórios do CGI.br - o que não quer dizer que sejam muito importantes para reflexões posteriores e também para a formulação de políticas públicas.

Não apenas "vendendo o peixe", - o que muito poderiam dizer, já que sou professora de Sociologia para o Ensino Médio - penso nas disciplinas Filosofia e Sociologia como
potencializadoras de questionamentos que devem ser levantados e orientados, assim como é a tecnologia potencializadora das habilidades para as exigências ao ser humano.


Ascher teve acesso!

Há quem diga que os adolescentes não gostam de pensar, - um amigo dizia: "pensar dói" - mas será que há tal exigência?

Nesse sentido, poderia até concordar com Ascher se seu artigo fosse mais expressivo
quanto à formação de professores. Sim, é necessário tal preocupação, já que há problemas na formação de professores de todas as áreas, inclusive Matemática e Letras.

Sabemos que muitas universidades possuem licenciaturas nem um pouco preocupadas com o
ensino!! Ora, o artigo provoca, mas não expõe, de fato, as problemáticas no ensino.

Muitos poderiam dizer: implementar as disciplinas Sociologia e Filosofia no Ensino Médio é como "enfiar a carroça na frente dos bois", e concordar com a frase de Ascher: mal se ensina a contar, ler e escrever. É ingênuo esperar que um país em desenvolvimento como o Brasil passe pelas fases que os países europeus passaram para crescer educacionalmente.

É preciso sim apoiar qualquer tentativa de promover provocações dentro das escolas. Provocações estas que incitem o pensar, os questionamentos sobre o que se é, o que se quer ser, como se vive, por que assim se vive... tantas questões que, na minha curta experiência como professora, não têm espaço nas disciplinas, tradicionalmente, existentes, pois assumem, na maioria das escolas, um currículo padrão, normativo, linear.

Talvez nada do que eu escrevi acima tenha importância para qualquer reflexão, e sim, a discussão deve partir do currículo - como bem incita Alice Casimiro Lopes.

Qualquer disciplina pode assumir uma postura crítica, questionadora sobre o ser, sobre o social. Ou ainda, muito provavelmente, muitos professores de Sociologia ou Filosofia usam, ou se não há, desejam usar, alguma cartilha básica.

Há muito o que se discutir!!! Mas Ascher, sem dúvida, escreveu o que muitos gostariam de ter escrito e, assim, cumpre o seu papel de formador de opinião.

4 comentários:

  1. Será que existem professores aptos para lecionarem disciplinas de L. Portuguesa, Matemática e Química???
    A profissão de professor é aprendida na prática e não na graduação. Professores das disciplinas acima citadas têm livros didáticos e podem seguir os livros de cabo a rabo que fica td bem! Os docentes de Filosofia e sociologia têm que planejar, roterizar e pesquisar, recortar texto pra dar aula! Embora haja livros no mercado p/ essas diciplinas as escolas públicas não adotam livros como o do Tomazi ou da Chauí. POR QUE? No Estado do PR, nós temos o livro didático público. Mas, os autores não aceitam críticas e não alteram seus textos! Ou seja, muitos erros e a segunda edição já está disponível! Inviável utilizar apenas o livro didático do estado!
    Acredito que muitas das pessoas q pensam e pesquisam educação e ensino nunca pisaram os pés em uma sala de aula ou faz muito tempo que não conhece empiricamente o ensino, principalmente nas escolas públicas.
    Só pra registrar o fato: meus alunos não sabem como e o que se deve escrever num texto dissertativo, pedir que distinguam o texto dissertativo do narrativo é pior, as definições mais catastróficas são ouvidas... prosa e verso? hahahahaha verso alguns sabem o q é, mas prosa pra eles é uma "prosa na esquina com o fulano". Em matemática, a coisa piora, eles não conseguem achar a média deles no final do bimestre... De que série estou falando??? Terceiro ano do Ensino Médio!
    Os docentes das outras disciplinas são realmente bem qualificados e estão fazendo exatamente o q o governo quer! Ótimo! Parabéns!!!

    Ah! mais um detalhe! "Despertar o espírito crítico do aluno"não deve ser uma especificidade da filosofia e da sociologia, mas sim de todas as disciplinas. E professores, comecem a pensar antes q seu aluno perceba q vc não pensa e não reflete sobre o q ensina!!! hehehe

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  2. Cara Daliana, argumentos como o de Nelson Ascher são compartilhados pelos jornalistas Mainardi e Reinaldo Azevedo, ambos colunistas da Veja, sendo o segundo formado em Ciências Sociais, pelo filósofo Olavo Carvalho e outros que pertencem a "nova" direita brasileira. Assim o argumento deles é extremamente de afirmação ou negação política. Trata-se da educação conforme a visão dos que se colocam no campo do conservadorismo.

    Abraço
    Marcelo Antonio

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  3. Nelson Ascher é um arrivista do Direitismo nacional que quer travestir o coronelismo e a submissão de naturalidade, através de um lugar comum que a classe dominante ("elite" seria elogio) adora: "para que essa gente quer aprender a pensar, se o lugar deles na vida é cortando cana na minha fazenda de biodiesel, ou me servindo de doméstica?". Uma vez assisti um banqueiro, na década de 1990 ,dando uma palestra numa universidade dizendo que ensinar História no ensino básico era supérfluo, que isso não tinha utilidade alguma para o "mercado" (isto é, para ele). A crônica do Ascher é apenas isso, ou melhor, é reacionarismo tacanho combinado com medo de ser questionado nas suas (poucas) "luzes".

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  4. Imaginei Anônimo!
    Eu tenho medo desses caras, e um tanto de brasileiros conservadores que, me parece, só crescer a parcela! Me causa medo tanta hipocrisia!

    Este comentário não mereceria ser de uma figura anônima neste blog, pô!!

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